As birras são um dos temas mais comuns pelas quais os pais e cuidadores pedem ajuda ou procuram informação. Por isso, é importante considerarmos alguns pontos quando se trata de lidar com o mini furacão que surge.
As birras são, na verdade, uma forma de expressão, que varia na sua
intensidade e objetivo, assim como na sua forma de expressar. Contudo, são
sempre uma manifestação de emoções, de forma indiscriminada, pela imaturidade
ao nível da compreensão e distinção dos diferentes sentimentos, que permitiriam
uma adequada regulação emocional. Representam
frequentemente a expressão de frustração, irritação, insegurança, medo e/ou
desconforto físico, que não consegue ser expresso verbalmente pela fraca
literacia emocional e pela simplicidade cognitiva esperada em idades tenras.
Embora as
birras tenham o superpoder de fazer os adultos perderem a cabeça, elas têm
extrema importância uma vez que representam uma forma de expressão pessoal, de
desejos e necessidades, e que muitas vezes são a forma de despertar a atenção
dos adultos que não estão atentos às mensagens enviadas pelas crianças e,
ainda, são também um estágio para a independência e capacidade de tomada de
decisão.
Deixo a minha
definição favorita, a que distingue os tipos de birra, as quais temos a agradecer
à Dra. Clementina Almeida. Passo a distingui-las segundo a mesma¹:
“A birra emocional: aquela em que a criança está a sentir-se frustrada
(porque, por exemplo, não consegue vencer um desafio que propôs a si própria,
rumo à sua independência, como seja, apertar os botões do casaco) ou a
transbordar de emoções”.
“A birra dramática: esta é bem diferente, até
porque não costuma ser acompanhada por lágrimas e relaciona-se mais com o
desejo da criança em obter algo, ou seja, tentar influenciar a nossa decisão.”
Para nós,
adultos, as birras têm o superpoder de simular a sensação de termos a cabeça a
explodir. Contudo, temos a função de sermos tradutores, orientadores e promotores no
crescimento emocional das crianças e na descodificação da birra. Por isso, o
papel do adulto na gestão deste assunto é extremamente importante, o que
significa que a sua conduta é tão relevante de se trabalhar quanto a da
criança.
É preciso analisar se as birras são um prolongamento do ambiente proporcionado pelo adulto.
Dificilmente a criança aprenderá a não comunicar através de gritos, manipulação
e de foco nas coisas negativas, se o exemplo maduro não estiver capaz de
acalmar, de ser lógico ou arranjar soluções viáveis. Assim, uma autoanálise e autodescoberta,
e se necessário, um trabalho de crescimento psicológico, poderá ser uma chave
importante para resolver o problema das birras no contexto da família. E é por
isso que a recomendação passa por Coaching Parental.
Um outro assunto
que considero relevante deixar aqui é resistir “dor” dos olhares alheios, face
ao aparecimento da birra, não se deixe intimidar pelos olhares e julgamentos
dos outros, pois isso poderá agravar a possibilidade de, naquele contexto,
voltar a acontecer por perceberem o quanto o cuidador está atrapalhado, assemelhando-se
a uma pequena vitória saborosa. Depois do local do incidente, o efeito da
solução para gerir o assunto não tem o mesmo impacto.
E como prevenir o seu
aparecimento?
Ao contrário de nós,
a criança tem maior dificuldade em identificar o gatilho daquela conduta e
compreender os sinais físicos e emocionais para poder pará-los. Mas seja como
for, as birras representam sempre uma expressão de uma necessidade ou de
sentimentos intensos com os quais está incapaz de lidar.
Antes de mais, prevenir o seu aparecimento
depende do valor que lhes damos. Não podemos desvalorizar nem sobrevalorizar.
Desvalorizar significa não criar limites, não atender a possíveis pedidos de
ajuda, desvalorizar as necessidades e não validar os seus sentimentos.
Sobrevalorizar é tornar as birras um caminho para sobrepor a sua vontade, faça
sentido ou não, é passar a mensagem de que comportamentos disruptivos são uma
forma de solução e que a manipulação é uma ferramenta adequada para atingir os
seus fins.
Por isso, é importante haver um equilíbrio
e assertividade durante a experiência de birra, tornando essas ações realizadas
futuras balizas para evitar birras intensas, isto é, pela forma como é gerida a
situação, a criança aprende quais são os limites das situações, comporta-se
consoante a sua aprendizagem, aceita mais facilmente o impedimento/incomodo do
qual reclama, na base, sente-se mais segura. E não se trata de conformismo, mas
sim de ser capaz de ser mais racional porque lhe foram ensinados os motivos e
as regras do sistema familiar e social.
O que desencadeia as birras?
A
prevenção passa também por identificar o que desencadeia as birras. Poderá
dever-se à qualidade do ambiente, isto é, se há estímulo a mais (barulho,
luzes, agitação) e ela reage ao seu corpo tenso, irritado, excitado e/ou
descontrolado ou se, por outro lado, há pouca estimulação e o cérebro exige ser
mais despertado, alimentado e/ou desafiado.
Ao
nível emocional, poderá simbolizar frustração, zanga, medo (que poderá,
até, não ser percepcionado como tal e, por isso, a nós adultos não parece ser
essa emoção), aflição perante assuntos sensíveis que observa, escuta ou
percepciona (pode percepcionar mas não compreender).
As
birras também acontecem como uma disputa de poderes. Frequentemente, com
pais que estejam mais frágeis, por que motivo for, as criança entram em disputa,
que serve para testar limites e, até, apelar a que o adulto seja capaz de a
conter emocionalmente. É frequentemente uma forma de testarem “quanto gostam
delas”. É preciso contextualizar que os cuidadores que estão frágeis muitas
vezes estão também indisponíveis, emocional e fisicamente, e que a sua
capacidade de cuidar está comprometida e, consequentemente, cuidar menos poderá
criar na criança o receio de não ser amada o suficiente.
As
mudanças de rotina podem ser um alívio, mas também, uma grande confusão
na cabeça dos mais novos se isso significar instabilidade no dia-a-dia.
A previsibilidade é uma forma de criar estabilidade para a criança, uma vez que
há maior controlo do ambiente em redor e alinhamento com os seus conhecimentos.
Ajustar a novas dinâmicas pode ser exaustivo e ela tenderá a ficar incomodada,
expressando-se da forma que sabe, através da birra.
Poderão
surgir por imitação, dos pares, dos adultos (sim, os adultos também
fazem birras), ou outros, se perceberem que traz ganhos, sejam eles quais
forem, e/ou poderá ser a única forma que conhece de se expressar, por repetir o
que o meio envolvente lhe ensina.
Aceitar
que não temos o que queremos, sempre quando o queremos, da maneira que queremos
é difícil mesmo em idade avançada. No caso das crianças, o funcionamento é semelhante,
mas a capacidade de resiliência e de aceitação é menos eficiente pela curta
experiência de vida. Por isso, quando o cérebro e o corpo emitem sinais de ameaça
à sua satisfação, a tendência será a de reagir, e a birra é a forma mais
natural.
Por
fim, a birra pode surgir por indicar uma necessidade fisiológica que
deve ser atendida, como a fome, o sono, doença ou outro desconforto físico no
geral.
Como se manifesta a birra? O que assistimos?
Apesar de ter a certeza que já
assistiu e sabe como se manifesta a birra, nunca é demais recordar o que
podemos encontrar. Assim, o comportamento que podemos observar é choro, gritos,
vocalização de choro mas sem lágrima, movimentos físicos como atirar-se para o
chão, pontapear, bater, atirar e/ou destruir
objetos, fugir, saltitar e bater o pé, entre outros. Por norma, são reações e
manifestações desajustadas à situação em causa.
Existe idade para começarem às
birras?
A
literatura sobre o assunto apresenta várias propostas para data de início das
birras, havendo mesmo o tradicional comentário de que “os terríveis dois anos”
ou que “os dois anos são a adolescência da infância”. Porém, para mim, importa
saber que as birrar surgem desde cedo, com intensidades e formas de se
expressar diferentes, sendo pouco importante quando começam e dar sim enfoque
em, quando surgirem, saber o que fazer com elas.
Que estratégias podemos adotar?
Existem várias estratégias, mas é importante
relembrar que nem todas funcionam para todos, nem todas as situações. Devemos estar
com um espírito de descoberta e ajustar às necessidades de cada família.
Livros –
Existe uma vasta oferta de livros que falam sobre o assunto, e deixo-vos a
sustão do Livro “A Grande Birra”, de Tom
Jamieson. Os livros têm especial importância para ir falando sobre o assunto,
de uma forma indireta, que poderá servir para fazer a passagem para falar sobre
um acontecimento que tenho ocorrido com a criança. O livro permite criar um
distanciamento suficiente para que a criança não esteja em modo defensivo e
seja capaz de integrar os problemas, as consequências e as soluções.
Técnicas
de Relaxamento – Ensinar a criança a
respirar, preferencialmente antes das situações acontecerem, é benéfico para
terem logo à mão uma solução imediata para gerir o corpo agitado. O treino
desta técnica permite ter maior consciência corporal, essencial num momento de
descontrolo emocional, para ser mais fácil reconhecer o que está a acontecer e
auto-dominar-se.
Reforçar Comportamentos
Desejados e Assertivos – Quando
houver mudança do comportamento, na primeira oportunidade, valorize a transição
de atitude, verbalizando e até mesmo reforçando com carinho (abraço, beijinho,
etc…). A tendência será de não voltar aos comportamentos anteriores.
Manter a calma para ser o
espelho da criança – O caos não é amigo da
solução, por isso, por mais que queira também sentar-se no chão a fazer birra
da birra, mantenha-se tranquilo e poderá tentar falar com a criança. Seja
assertivo e peça que lhe olhe nos olhos (para recentrar a atenção e vocês
garantir que está a ouvi-lo.
Comunicação não-violenta e
não violência física – A violência costuma profetizar
mais violência e, na verdade, a birra já é um ato de violência enorme para o
pequeno corpo e jovem mente. Comunicar com violência apenas trará medo ou
oposição e, jamais, respeito.
Comunicação “Quanto Basta” – Quando estamos numa situação de birra, é comum querermos
explicar o motivo da nossa zanga, dar lições de moral ou outras mil coisas que
aquele momento emocional nos traz à cabeça. Mas na verdade significa mais uma
descarga para nós adultos do que realmente uma estratégia para gerir a
situação. Por isso, deixo a sugestão de dar espaço, tempo e aguardar
pacientemente. Deverá ir dizendo algumas coisas, mas que sejam de validação
como “eu sei que estás muito zangado mas, não faz mal, eu estarei aqui quando
te sentires mais calmo”, “vejo que estás zangado mas, se me disseres o que te
deixa tão zangado, pode ser que possa ajudar-te”.
Desviar a atenção – Poderá parecer
que estamos a evitar o assunto ou mesmo fingir que não há ali um apelo da
criança mas perante birras “dramáticas”, em que poderá estar a haver apenas
manipulação, o desvio do foco para outra coisa poderá ser suficiente para
impedir que tome proporções elevadas.
Consequências e
não castigos – O termo castigo pode ter tido o seu sucesso quando os miúdos
eram diferentes e quando não se sabia o pouco valor pedagógico desta prática.
Consequências parece-me uma prática mais ajustada porque é o que efetivamente
acontece quando optamos por condutas menos agradáveis. Consequência não é
apenas um outro nome para castigo, é sim uma forma de explicar aos mais
pequenos que devido àquele momento, poderão ter perdido alguns prazeres ou
privilégios que iriam ter naquele curto espaço de tempo (por exemplo, ver um
filme que iam ver). Esta forma de agir tem o objetivo de fazê-los perceber que
aquela forma que escolheu para lidar com as emoções não é uma boa estratégia.
Há
“nãos” que simplesmente são “Nãos” – Apesar das correntes atuais dizerem (e bem) que o diálogo e a
negociação devem fazer parte do reportório na gestão da birra, há alturas em
que o não firme, com explicações noutro momento quando a maturidade já for
maior, serve de almofada para amparar o conflito interno que já existe dentro
da criança. É um limite necessário para um bem maior, abrandar uma emoção que
está ao rubro.
Rotina como previsibilidade
– para as crianças mais
pequenas, a previsibilidade ajuda a transmitir um certo nível de controlo. Este
controlo interno que a criança sente ajuda a estabilizar o mundo emocional.
Estando a criança mais estável emocionalmente é menos provável que as birras
surjam ou pelo menos que surjam em níveis de descontrolo intenso.
“Já fiz tudo e nada resulta”
de que forma o profissional me pode ajudar?
As birras são geralmente o
sintoma de um ambiente em que algo está desequilibrado. Podem ser os
pais/cuidadores ou a criança. Por isso, o Coaching Infantil e Parental podem
ser uma boa ajuda para lidar com esta situação (sabem mais AQUI) https://www.marquespsicologa.pt/coaching-infantil.html
Ajudará a identificar potenciais gatilhos e sistemas que potenciam este comportamento. Juntos com o técnico, serão definidas metas, haverá um acompanhamento dos objectivos e um ambiente motivador para conseguir a mudança de comportamentos.
Apoio para Inspiração:
1. https://www.portoeditora.pt/paisealunos/pais-and-alunos/noticia/ver?id=135084&langid=1
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